sábado, 9 de dezembro de 2017

Disparidades 4

In recent years, as high rates of maternal mortality in the U.S. have alarmed researchers, one statistic has been especially concerning. According to the CDC, black mothers in the U.S. die at three to four times the rate of white mothers, one of the widest of all racial disparities in women’s health. Put another way, a black woman is 22 percent more likely to die from heart disease than a white woman, 71 percent more likely to perish from cervical cancer, but 243 percent more likely to die from pregnancy- or childbirth-related causes. In a national study of five medical complications that are common causes of maternal death and injury, black women were two to three times more likely to die than white women who had the same condition.

domingo, 26 de novembro de 2017

Disparidades em português

Um em cada 73 cidadãos dos PALOP com mais de 16 anos em Portugal está preso. É uma proporção dez vezes maior do que a que existe para os cidadãos portugueses — onde um em cada 736 cidadãos na mesma faixa etária está detido. O número sobe para 1 em 48 quando se trata de cabo-verdianos, a comunidade africana mais expressiva em Portugal: ou seja, 15 vezes mais.
Mais um dado: se tivermos apenas em conta os homens, que constituem, na verdade, o grosso da população prisional, concluímos que um em cada 37 cidadãos dos PALOP está preso versus um em cada 367 homens portugueses (e uma em cada 1071 mulheres dos PALOP versus uma em cada 6732 portuguesas).

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Serviço cívico

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terça-feira, 21 de novembro de 2017

Uma justiça em segredo

As declarações para memória futura, prestadas nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal, não têm de ser obrigatoriamente lidas em audiência de julgamento para que possam ser tomadas em conta e constituir prova validamente utilizável para a formação da convicção do tribunal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 355.º e 356.º, n.º 2, alínea a), do mesmo Código.
Vale a pena ler, mesmo que a paciência já não seja muita, as declarações de voto dos vencidos.


segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Serviço cívico


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sábado, 18 de novembro de 2017

O alarme social

A morte de uma emigrante, baleada quando se dirigia para o seu emprego, nunca será causa de alarme social. Assim acontece com a morte de qualquer estranho, independentemente das suas circunstâncias. A preocupação cívica seria não ter havido alarme social, caso não soubéssemos que este, o alarme social, não é uma medida ética, mas apenas uma desconformidade retórica que não dignifica uma sociedade.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Redefinir ou extinguir

No DN, Paulo Tavares questiona o desempenho da Secretária-Geral de Segurança Interna, sugerindo que "se o cargo e as competências estão mal desenhados, redesenhe-se a coisa ou acabe-se com a figura". 
Sobre o tema, escrevi em 9 de agosto de 2011:
A criação do Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna foi um equívoco teórico e um descuido governativo. Pensar que um super-polícia, assim batizado em pasquinês, poderia coordenar as tensões que os anos refinaram até ao absurdo, adiou a solução de um problema que continua a ser caro ao país e prejudicial à sua segurança.
13 anos depois do 11 de setembro e 6 anos após a criação inglória de um secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, continua-se, à volta de uma mesa, a analisar o conceito e a perspetivar a organização. Tanta análise só denuncia a incapacidade política, nos sucessivos governos, para um consenso entre os ministros intervenientes. A dispersão das tutelas policiais, estimulando os corporativismos e as clientelas ministeriais, é a doença infantil da Segurança Interna. Até lá, a análise continuará: irresoluta.

domingo, 12 de novembro de 2017

Uma lei por metade

Com alguma discrição mediática, foi publicada, em 23 de agosto, a Lei nº 93/2017, estabelecendo o regime jurídico da prevenção, da proibição e do combate à discriminação, em razão da origem racial e étnica, cor, nacionalidade, ascendência e território de origem.
É aplicável, de acordo com o seu artigo 2º, a todas as pessoas singulares e coletivas, pública e privadas, no que respeita à proteção social, incluindo a segurança social e os cuidados de saúde, aos benefícios sociais, à educação, ao acesso a bens e serviços, colocados à disposição do público, incluindo a habitação, e à cultura.
De fora, ficaram a segurança pública e a justiça. Aí, ou não haverá discriminação, ou haverá outros instrumentos jurídicos de proteção que desconheço.

sábado, 11 de novembro de 2017

Os advogados não são polícias

Os advogados não são polícias nem parapolícias. O seu desempenho só pode/deve ser aferido na fidelidade à defesa daqueles que representam. Qualquer entrave a essa fidelidade, qualquer distorção na confiança que é central na relação entre o advogado e o seu cliente, são contrários aos princípios que informam e garantem o Estado de Direito. A luta contra a corrupção não justifica a corrupção dos princípios.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Dessacralizar a justiça

Há pouca literatura no Centro de Estudos Judiciários. O muito que se tem escrito sobre a justiça em romances, novelas ou contos de leitura inolvidável, não deveria ser descurado na formação de magistrados. Acabei de reler o romance de José Rodrigues Miguéis, Uma aventura inquietante, e, relido a uma distância de 50 anos, descubro uma reflexão ímpar de ironia sobre a investigação criminal e a prisão preventiva. Cenas delirantes como a que acontece quando o preso é sujeito a exame psiquiátrico, ou humilhantes como a que acontece no seu interrogatório policial, ajudam-nos a dessacralizar a justiça. O que sublinhei: três fatores que podem prejudicar a investigação - lisonjear a opinião pública, não suspeitar dos grandes deste mundo, e/ou seguir a pista mais cómoda que se oferece.

sábado, 4 de novembro de 2017

Uma violência latente

Há uma violência latente nos negócios da noite de que o Estado não pode desonerar-se entregando a sua prevenção a entidades privadas. O sistema de controlo da atividade das empresas de segurança, às quais não bastará a auto-regulação, tem falhado. O perigo de contaminação das entidades públicas nesta área é um risco óbvio que urge combater. A (in)segurança dos cidadãos, num mundo de silêncios e cumplicidades, não pode estar dependente de um vídeo ocasional.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Disparidades 3

A new study from Carlos Berdejo of Loyola Law School demonstrates for the first time that there are significant racial disparities in the plea deals that white and black people receive on misdemeanor charges—with black people facing more severe punishment.
Berdejo analyzed 30,807 misdemeanor cases in Wisconsin over a seven-year period and found that white people facing misdemeanor charges were more than 74 percent more likely than black people to have all charges carrying potential prison time dropped, dismissed, or reduced. And white people with no criminal history were more than 25 percent more likely to have charges reduced than black people who also had no criminal history.
This suggests, as Berdejo concludes in his report, that prosecutors use race to judge whether a person is likely to recidivate when deciding what plea to offer.
Prior studies have found racial disparities in the plea bargaining process. The Berdejo study differs, however, in that it analyzes a detailed statewide data set of the entire life of criminal cases, from charging to sentencing, making it more reliable and expansive.
The majority of arrests nationally are for misdemeanor charges. At The Bronx Defenders, where we provide public defense services to low-income people in the Bronx, we had over 18,000 new misdemeanor cases in 2016 alone. That was more than three quarters of our cases, and about half of all cases that we closed last year resulted in plea deals.
If there are racial disparities in pleas in misdemeanor cases that lead to worse punishment of black people, it means a significant proportion of our criminal justice system is meting out punishment in a racially-biased manner.
Prosecutors wield enormous power and total discretion in deciding whether and how to charge people, whether to request pre-trial detention or money bail, and what plea to offer. One factor guiding this decision is whether the attorney believes the person will be held on bail. Frequently, people charged with misdemeanors accept pleas just to go home.
s the person will be held on bail. Frequently, people charged with misdemeanors accept pleas just to go home.

When Race Tips the Scales in Plea Bargaining, Jenn Rolnick Borchetta/Alice Fontier



domingo, 29 de outubro de 2017

O legado de George Smiley

-Então terá sido tudo pela Inglaterra? - prosseguiu. - Houve tempos, claro que houve. Mas a Inglaterra de quem? Qual Inglaterra? A Inglaterra sozinha, um cidadão de nenhures? Eu sou europeu, Peter. Se eu tinha uma missão, se alguma vez tive consciência de alguma para além da nossa questão com o inimigo, era para com a Europa. Se eu era desumano, era desumano pela Europa. Se tinha um ideal inatingível, era o de conduzir a Europa das suas trevas a uma nova era da razão. Ainda a tenho.

John le Carré, Um legado de espiões

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

O regresso do obscurantismo

O artigo da Professora Maria de Lurdes Rodrigues, hoje publicado no DN, com o título que encima este post, é uma das mais importantes reflexões sobre a justiça que tenho lido nos últimos anos:
"A opacidade das decisões judiciais favorece más práticas. Pelo contrário, o conhecimento, a informação e o debate livre e plural são a chave para um funcionamento mais transparente da justiça. A divulgação sistemática e organizada do conteúdo das sentenças, tornando-as acessíveis de facto, é muito importante para o escrutínio e o debate público sobre as decisões do poder judicial, como aliás se comprovou neste caso. A divulgação dos termos do acórdão pelos meios de comunicação e a denúncia pública dos fundamentos da sentença geraram um conjunto de iniciativas e debates, de tomadas de posição que são, certamente, o primeiro passo para uma reflexão sobre o que é necessário fazer para que não ocorram situações semelhantes."

Em 26 de dezembro de 2011, neste blogue, escrevi sobre o mesmo assunto:
A publicidade das decisões é uma das fontes que legitima a função judicial. Quanto mais ampla e rápida ela for, maior será a perceção social dessa legitimidade. Por isso mesmo, não se compreende que as bases de dados jurisprudenciais não contenham todas as decisões e sejam alvo de prévia seleção. Os meios técnicos disponíveis permitem um conhecimento on line do que se decide e como se decide. Uma jurisprudência a duas velocidades, uma para publicar e outra para não publicar, é manifestamente desadequada.

E em 2 de agosto de 2013, com o título Senhor do direito e jurado:
 aqui escrevi sobre a necessidade de uma pronta publicidade das decisões judiciais. Talvez ajudasse à contenção teórica e ao aprumo decisório. No nosso sistema judicial, comum na generalidade da Europa, o juiz é, a um tempo, senhor do direito e jurado. Numa sociedade onde o direito abunda, a final quem claudica é o jurado.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Armas de fogo nos EUA

Nos EUA, existem cerca de 130 milhões de armas de fogo civis. Contrariando a ideia generalizada de que todos os americanos possuem, pelo menos, uma arma de fogo, a verdade é que são apenas detidas por 3% dos americanos adultos. Ou seja, os 7,6 milhões de americanos que detêm armas, terão, em média, 17 por cada um deles.

Fonte: GPS, Fareed Zakaria

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Em questão: a análise do ADN na cena do crime

The National Institute of Standards and Technology announced last week that it is launching a new study of certain types of DNA analysis used in criminal prosecutions. These methods, “if misapplied, could lead to innocent people being wrongly convicted,” according to the institute’s statement. NIST will invite all public and private forensics labs in the U.S. to participate by testing the same set of complex DNA samples, and will compare the results, which will be published online next summer. Its goal is to develop a new set of national standards for DNA analysis.


Este artigo contem uma excelente entrevista com John Butler.

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Disparidades 2

While the majority of all arrests and all stop and search incidents in 2015/16 were of White people, those in an ethnic minority group were over one and a half times more likely to be arrested than White people and were 3 times as likely to be stopped and searched. The differences were more marked among Black people, who were over 3 times as likely to be arrested than White people and over 6 times as likely to be stopped and searched. Almost 1 in 10 men arrested was Black, and 1 in 6 stop and search incidents was of a Black person. For every 1,000 Black people, there were 31 stop and searches conducted in this group, compared with just 5 searches for every 1,000 White people.


Race Disparity Audit -Summary Findings from the Ethnicity Facts and Figures Website (Documento publicado em outubro de 2017, pelo Governo inglês, que vale a pena consultar aqui)

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Uma lei boa

A Lei nº 59/2017, de 31 de julho, introduziu alterações à Lei nº 23/2007, de 4 de julho, dando uma nova configuração ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.
O que com ela se pretende é dignificar o estatuto do cidadão estrangeiro que, não podendo recorrer ao regime dos "Vistos Gold", quer viver em Portugal.
É triste que uma lei boa seja alvo de ataques que fazem apelo, com argumentos que misturam fantasias e medos, a sentimentos sórdidos de xenofobia.

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

A Meo e a subversão da ética comercial

Há uns meses, recebi uma fatura da Meo (serviço de banda larga) com um custo acima daquele que habitualmente me era debitado.
Pensei tratar-se de um lapso que viria a ser corrigido, o que não aconteceu.
Decidi, então, acabar com o serviço dado que não estava vinculado a qualquer período de fidelização.
Dirigi-me a uma Loja Meo para o efeito, tendo-me aí sido dito que o deveria fazer telefonicamente.
Liguei para a Meo por diversas vezes e em diferentes dias, ficando à espera de ser atendido entre 15 e 30 minutos, o que não ocorreu.
Liguei, então, com o propósito de falar com alguém da Meo.
A chamada foi atendida de imediato.
Depois de ter dito à operadora ao que ia, esta disse-me que deveria ter carregado algum programa e que isso se traduziu na assunção de um novo preçário, mas que se poderia acertar um novo preço.
Respondi-lhe que não o pretendia, continuando com o propósito de me desligar da Meo.
Disse-me que, sendo assim, iria reencaminhar a chamada para quem trataria do assunto já que essa seria matéria que não lhe competiria.
Fiquei de novo em suspenso, sem que ninguém atendesse a chamada.
Em 24 de abril e 27 de junho, reclamei para a Anacom, nomeadamente no sentido de saber se com aquele comportamento a Meo podia continuar a exigir o pagamento de um serviço que já sabia que o cliente não desejava e que também sabia, pois para isso tem meios, que o cliente não utilizava.
Até agora não obtive resposta da Anacom.
Em 27 de julho, recebi um telefonema da Meo alertando-me que devia uma certa quantia.
Tendo dito à operadora que há meses tentava acabar com o contrato, esta respondeu-me que estava findo.
Paguei a quantia.
Afinal não estava findo, mas suspenso, pelo que, pagado o que devia, a Meo continuou a debitar-me novas quantias.
Pelo site da Anacom, dirigi-me diretamente à Meo, da qual obtive, por duas vezes, a mesma resposta cínica: não receberam qualquer carta, com cópia do cartão do cidadão, solicitando a rescisão do contrato.
Sobre os telefonemas, ignoraram que esse era o cerne da questão.
O assédio da Meo continua, como continua o silêncio da Anacom.
Para cobrar mais, para alterar o tarifário, basta que alguém aceda a um qualquer programa sem dar por isso; para riscar a Meo da nossa vida, é uma vicissitude.
A Meo é concessionária de um bem público; se a concessão fosse democraticamente a votos, o meu seria não.

terça-feira, 12 de setembro de 2017

Não eu

Há o direito a um não eu? Não apenas ao esquecimento de mim, mas à recusa de mim? O pós-humanismo, ainda que não sendo uma desumanidade, questiona o ser e o ter de cada um de nós. A tutela judiciária da identidade não é suficiente num mundo de algoritmos e desidentificação. A defesa do eu já não pertence à jurisprudência, mas tem de estar ao alcance de uma tecla.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Da justiça na justiça

Da entrevista de Graça Fonseca ao DN:

Quando a sua tese de doutoramento conclui, com base em decisões entre 1995 e 2005, que o sistema judicial discrimina os estrangeiros, que retira daí?

Não temos dados em Portugal que não sejam de nacionalidade. O que se pode portanto analisar é que força preditiva tem essa variável no conjunto dos resultados. Na altura a Associação Sindical de Juízes reagiu dizendo que se tinha de ver o resultado com atenção... Mas usei um modelo matemático que é uma questão de probabilidades, não tem nenhuma subjetividade minha. No caso da justiça, até chegarmos à fase judicial há vários níveis de seleção. As condições económicas em que se vive, a zona onde se vive, toda a parte policial, depois ainda o MP e depois os juízes. E o percurso que fiz foi o de perceber qual o nível de seletividade. E percebe-se que todos esses níveis em conjunto contribuem para que os estrangeiros tenham muito maior probabilidade de prisão preventiva - por ser utilizado o argumento do perigo de fuga, sendo que na maioria nunca tinham vivido noutro país - e quando se é sujeito a prisão preventiva a probabilidade de prisão efetiva é superior. Tem-se pois um conjunto de mecanismos, em cadeia, que têm como resultado penalizar estas pessoas.

domingo, 20 de agosto de 2017

Disparidades

When one person killed another, 2 out of every 100 were found justified
When a white person killed a black man, 17 out of 100 were found justified
In almost 17% of cases when a black man was killed by a white civilian over the last three decades, the killing was categorized as "justifiable."
That disparity persists across different cities, different ages, different weapons and different relationships between killer and victim.

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Castanheiros, amoreiras e oliveiras

"Na sessão da Câmara de Vimioso de 29 de Outubro de 1803, determinaram «que toda a pessoa da vila e lugares do seu termo serão obrigados a pôr 3 castanheiros, 3 amoreiras, o que farão logo por seu tempo» sob pena de serem condenados na correição futura.
Na sessão da mesma Câmara de 21 de Dezembro de 1803 feita em S. Joanico (a Câmara ia fazer sessões às povoações a quem interessavam os assuntos a tratar) determinaram «que todos os moradores deste povo cada um de por si ponha 3 castanheiros e 3 oliveiras em cada ano» sob pena de ser multado quem o não fizer.
Na sessão da dita Câmara celebrada em Serapicos a 22 de Novembro de 1803 se impõe da mesma forma a plantação anual de 3 castanheiros e de 3 amendoeiras, mas não fala porém das oliveiras.
No mesmo dia celebraram a sessão em Vale de Frades com idênticas determinações quanto à plantação dos castanheiros e amoreiras."

Vimioso, Notas Monográficas, de Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal) e Adrião Martins Amado, Edição de 2002 (1ª Edição de 1968), pag. 234.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Leituras

E que dizer do juiz instrutor do processo? Para encurtar razões basta lembrar que recebeu a acusação in toto e acrescentou-lhe a nota artística esperável dos sabujos do regime que se afirmavam sempre mais papistas que o papa. Agora cito: concorrem contra o arguido as circunstâncias agravantes da premeditação, acumulação de crimes e de ter o mesmo, atenta a sua qualidade de pai de um juiz de direito, a especial obrigação de não os cometer - sublinhado do autor. Conclui: passe mandados de captura contra o arguido.
Devo confessar que não me lembro de me terem ensinado nos bancos da Faculdade de Direito, onde rompi os fundilhos de algumas calças, que existia a agravante que onera o comportamento de quem tem um filho juiz de direito. Contudo devo confessar com a máxima humildade que nem sempre estive atentos às lições dos mestres e nem sempre estudei o que se requeria a um estudante escrupuloso. Por essa razão deve ter-me passado desapercebida a invocada agravante pois longe de mim a ideia de duvidar da ciência jurídica do ilustre e douto magistrado.
O juiz de direito, de que o escritor era pai, foi vítima em criança do ataque do louco criminoso francês que atrás referi e lhe amputou a mão ao tentar assassinar a mãe, Grete Tiedemann, primeira mulher de Aquilino. Faleceu há poucos anos jubilado como conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça.
Do magistrado do 3º Juízo Criminal da Boa Hora e do delegado do Ministério Público que intervieram na confecção do processo já ninguém se recorda ou lhes lembra os nomes.

Pag. 81, do Capítulo Sétimo, QUANDO OS LOBOS UIVAM - O PROCESSO JUDICIAL

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Proteção civil e segurança nacional

Num curto período de tempo, a proteção civil e a segurança nacional foram postas em causa. São vertentes que se complementam e que integram as razões fundamentais de um Estado. Quando o Estado não as consegue realizar, permitindo o seu colapso, torna-se urgente um empenho político que não se consuma na retórica. Para a proteção civil e para a segurança nacional o tempo não é de meias verdades, mas de vozes límpidas e propósitos claros. De culpas e desculpas não estará o inferno cheio; a política, talvez.

sábado, 1 de julho de 2017

De paiol em paiol

Há uma ingenuidade trágica na justificação do assalto ao paiol de Tancos. A culpa foi de uma rede, dizem, que não teria sido remendada a tempo. É o mesmo tipo de justificação que um agricultor daria para o assalto, pela raposa, ao seu galinheiro. Eu pensava que aceder a um paio de material de guerra pressupunha várias etapas, várias barreiras, e que qualquer intruso seria detetado mesmo que com a rede em mau estado. Se não havia essas várias barreiras, nomeadamente as de natureza eletrónica, e com a rede em mau estado, o que seria público e notório, não se justificaria uma vigilância humana permanente? Para essa vigilância não seria necessário concurso público nem orçamentação para 2018.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Verdade ou oportunidade

Graças à eficiência dos serviços respetivos, os cadáveres foram identificados rapidamente; sendo verdade, não deixa de ser uma ironia macabra. Ainda não se tinha a dimensão da tragédia e já se dizia qual era a árvore que, atingida por um raio, teria sido a árvore da morte; sendo uma hipótese possível, também era uma amenidade política. Mesmo num tempo sôfrego de razões, as verdades não podem ser vítimas das oportunidades.

domingo, 25 de junho de 2017

SIRESP 2

A operadora responsável pela gestão do SIRESP será desresponsabilizada em caso de "raios, explosões, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais que diretamente afetem as atividades objeto do contrato", segundo o que leio neste artigo do DN.
Mas então o SIRESP não existe para ser um instrumento para a defesa do cidadão em caso de "raios, explosões, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais", para poder estar sempre operacional nessas situações?
Se assim não é, é urgente um outro SIRESP.

terça-feira, 20 de junho de 2017

SIRESP



Se o SIRESP falhou, algures, no seu primeiro grande confronto com uma catástrofe, então é preocupante. Em nome da tranquilidade do cidadão, o que se justificará é que se esclareça que não irá falhar perante um sismo, ou um acidente no metro, ou no contexto de qualquer outra grande catástrofe. A grande maioria dos portugueses ouviu agora falar, pela primeira vez, do SIRESP. E ouviu pelas más razões. Precisará das boas razões.

sábado, 17 de junho de 2017

Os algoritmos da justiça

Que operação permitirá condenar mais facilmente um negro do que um branco? Ou permitirá a desculpabilização mais rapidamente de um jogador de futebol do que de um político? Ou levará os agentes da justiça a, sem refletirem, sustentarem que as premissas anteriores não são verdadeiras? Os códigos são importantes, mas os conhecimentos que vieram depois são-no mais ainda. As emoções e os preconceitos não devem ser descartados nessa operação. 

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Metadados

O conhecimento dos dados dos dados é um instrumento fundamental para que os serviços de informações possam realizar as suas finalidades. Não vale a pena ter ilusões quanto à sua desnecessidade. A Constituição da República, desde um tempo em que os metadados eram uma miragem, não o consente. Por razões que desconheço, não foi possível, até agora, alterar a Constituição de modo a permiti-lo. A solução anunciada, com a judicialização da atividade das secretas em tal âmbito, não finta a questão da inconstitucionalidade nem se adequa à natureza destas. Será uma solução apenas na aparência.

terça-feira, 13 de junho de 2017

A corrupção das palavras: da delação premiada à colaboração premiada

Não há diferença ética entre um delator e um colaboracionista. A diversão das palavras não é um argumento mas uma inconsequência. Seria uma indignidade para a justiça considerar um delator um colaborador, então hoje em que ser colaborador é sinónimo de ser trabalhador/empregado.

sexta-feira, 2 de junho de 2017

As secretas e o mau-olhado

Quando parecia avizinhar-se uma acalmia, as secretas voltaram à rua e ao comentário presidencial. Não deve ser essa a sua vocação, muito menos o seu destino. No entanto, será avisado, num mundo de invejas, acautelar o mau-olhado.

Adenda: As secretas do bloco central, por Paulo Baldaia, no DN. Excelente.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Delação premiada, uma prova canalha

Não vale tudo. A história da justiça penal tem sido um longo caminho ao encontro da ética. Voltar à justificação inquisitorial dos meios e à razão pragmática da investigação tem mais a ver com a vingança do que com a justiça. Se é verdade que o populismo assentou arraiais na política com os resultados que são visíveis, seria uma ignomínia permitir que também na justiça viesse a ter lugar.

terça-feira, 16 de maio de 2017

Digital disruption and the law

The legal profession is finally experiencing the digital disruption that has swept through so many industries over the last decade. It’s transforming all aspects of lawyering, creating new ways of working in new markets with new roles and opening up new opportunities while traditional conventions wane.

Law graduates who understand the impact of digital innovations and are comfortable working with technology will be at an advantage with employers. So legal education needs to provide students with the technical skills to thrive in the digital world, and also the ability to navigate the complex ethical, legal and social implications of new technologies.

Para ler aqui.

sábado, 29 de abril de 2017

Perdoar

Não tenho procuração do Papa Francisco (longe disso!), mas creio (de crença) que ficaria mais agradado com um perdão de penas do que com a tolerância de ponto. Seria uma justa (de justiça) homenagem ao Papa da Misericórdia.

sábado, 8 de abril de 2017

Os crimes em 2016

Na evolução da criminalidade, 2016 foi um ano recorde, batendo inclusive, o de 2014, ano que tinha até agora registado o menor número de crimes.
Os crimes que mais desceram foram os que têm mais impacto no sentimento de insegurança: o roubo na via pública ou o roubo por esticão.
Até as escutas telefónicas baixaram
Realizaram-se 14758, o que a meu ver sendo muitas, correspondem a uma baixa de 4,4% em relação a 2015.
Houve também menos detenções de suspeitos, menos condenados, menos presos nas cadeias.
Não se poderia, no entanto, deixar de apontar um número verdadeiramente insólito: foram constituídos arguidos mais 27,5% do que em 2015.
Ou seja, houve mais 27,5% de cidadãos sobre os quais existirá uma suspeita fundada de que serão criminosos,

Fonte: DN de 31/3/2017

sábado, 18 de março de 2017

Aprazar, para leigos

No limite, a investigação de um crime pode ter o prazo da prescrição do procedimento criminal desse crime. A título de exemplo, se um crime for punível com pena de prisão cujo limite máximo é superior a 10 anos, o prazo da prescrição é de 15 anos, podendo a sua investigação prolongar-se por este número de anos. Mas também é de 15 anos, com igual beneplácito para a investigação, em certos crimes puníveis com penas de prisão cujo limite máximo é inferior a 10 anos, como ocorre nos crimes de peculato ou corrupção. Dir-se-á que o Código de Processo Penal fixa prazos substancialmente menores para a realização do inquérito, que é o molde processual em que decorre a investigação, mas, e aqui parece haver unanimidade, esses prazos são meramente indicativos. Ou seja, a sua violação não produz qualquer consequência processual, a não ser as respeitantes ao estatuto coactivo dos arguidos, se os houver. Se a violação dos prazos para o inquérito decorrentes da lei não acarreta qualquer consequência para a investigação, muito menos a acarretará qualquer violação de um prazo hierarquicamente fixado. Se é verdade que a pretensão punitiva do Estado se deve manter até o crime, pela prescrição, ser esquecido, não é menos verdade que essa pretensão, sem outros parâmetros legais, deontológicos ou éticos se pode tornar num exercício doentio de injustiças. Sobretudo na justiça, não se deve confundir aprazar e aprazer.

sexta-feira, 17 de março de 2017

Espiar é esperar

A afirmação encontrei-a num romance de John le Carré. Tem a poesia das evidências e a razão das incertezas. Se esperar é, muitas vezes, desesperar, compreende-se, então, o frequente desatino dos espiões. Não sei qual é a cotação dos espiões portugueses no mercado internacional, mas não desdenho que a possa ter, ainda que marginal. O que importará medir é a sua cotação interna, aquela que lhes justificasse, socialmente, a atribuição de outros meios. Não é bom ter os nossos espiões no limbo de uma desesperança.

Uma justiça social

Nos anos de 2015 e 2016 a suspensão provisória do processo foi aplicada pelo Ministério Público, a nível nacional, na fase de inquérito, na fase preliminar do processo sumário e em sede de processo abreviado em 37.032 situações (em 2015) e em 36.623 situações (em 2016), num total de 73.655 casos.
Os crimes em que a aplicação da suspensão provisória do processo teve maior expressão continuaram a ser os crimes de Condução de veículo sob influência de álcool (27,99% em 2015 e 25,92% em 2016), de Condução sem habilitação legal (12,66% em 2015 e 11,23% em 2016), de Violência doméstica contra cônjuge ou análogos (6,95% em 2015 e 6,7% em 2016), de Desobediência (4,75% em 2015 e 5,22% em 2016), e de Ofensa à integridade física simples (4,71% em 2015 e 4,82% em 2016).

O Relatório pode ser consultado Aqui

segunda-feira, 13 de março de 2017

Megaprocesso

Um megaprocesso sustenta mais o imaginário do que a justiça.

quarta-feira, 8 de março de 2017

Leituras

Eles vinham, entravam, saíam e fizeram, logo no início, uma coisa horrível. Aliás, acho que na PIDE eles tinham formação em tortura e humilhação. O que eles me fizeram foi encostar-me a uma parede - mas eram muitos, não eram só aqueles agentes que aparecem no processo - e começaram a fazer escarro ao alvo. Punham-se a escarrar a ver quem é que me acertava. O alvo era eu. Isto foi uma das coisas que fizeram, que é extremamente humilhante.
A outra coisa que fizeram, ao mesmo nível, foi o seguinte: punham-se dois pides, um na frente do outro, a uma certa distância, agarravam-me pela cintura e atiravam-me, como se fosse uma bola, de um para o outro, no ar, o que faz com que a pessoa perca o equilíbrio.

(Pag. 95)

terça-feira, 7 de março de 2017

O equilíbrio instável

O equilíbrio dos poderes, ou a sua falta, têm minado, nas sociedades democráticas, a própria crença na democracia. Se é verdade que, muitas vezes, a política quis ter uma voz na justiça, não é menos verdade que a justiça se foi tornando, em nome da independência, num expressivo lóbi político. A estanquidade dos poderes é uma ilusão retórica que só tem servido para os degradar. Ou sabem conviver, não ignorando que cada um deles não tem valores absolutos, ou continuarão a contribuir para o desvalor da democracia.

quinta-feira, 2 de março de 2017

A desilusão do ADN

O primeiro perfil de ADN de um condenado foi inscrito na respetiva base, com pompa e circunstância, em 12 de fevereiro de 2010. As expectativas criadas, resultantes das fantasias televisivas, parecem ter sido goradas. Segundo o DN, apenas deram entrada na base de dados perfis de 6077 condenados com penas de prisão de três anos ou mais, ou seja, apenas de um quinto dos condenados com idênticas penas no mesmo período. Sendo a inserção dependente de decisão judicial, o que se pode concluir é que, num número significativo de condenações, o tribunal entendeu que não se justificaria que os perfis de ADN dos correspondentes arguidos viessem a ser integrados na base de dados e que o Ministério Público terá estado de acordo com essas decisões. A solução anunciada será a de tirar ao tribunal esse poder de decisão, vindo a inserção a ser resultado automático da condenação. É mais uma solução na senda da desjudicialização?

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Brocardo

Tanto quanto a política não deve condicionar a justiça, a justiça não deve condicionar a política.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Fugas

Primeira fuga
Há dias, três presos evadiram-se de um estabelecimento prisional. Os dois que se deslocaram para Espanha já foram capturados. O outro, o que presumivelmente ficou em Portugal, ainda o não foi.
Segunda fuga
Como se estas tivessem sido as primeiras evasões ocorridas em estabelecimentos prisionais portugueses, ficámos a saber que não existe ainda um protocolo de procedimentos para quando ocorre uma evasão.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Leituras

O juiz mandou-me finalmente erguer, e, sem tirar os olhos de um maço de processos que tinha na mesa, perguntou-me:
- Tem mais alguma coisa a alegar em sua defesa?
Era um homem com olhos pequeninos, penetrantes, intrincheirados nuns óculos de míope, e tinha os cabelos raros e revoltos sobre a testa vasta. Pareceu-me que seguia o julgamento com a mesma automática indiferença com que os padres oficiam. Digo mesmo - como se não acreditasse na eficácia da justiça.
O delegado, esse, compusera uma grande e nobre seriedade para a galeria, que seguira com interesse o julgamento, não decerto por amor da justiça, nem porque eu lhe despertasse comiseração: mas na esperança de ouvir relatos dramáticos e torpes.
Os senhores jurados bocejavam, quando não dormitavam.
Que dissera o delegado na sua acusação? Não me posso lembrar precisamente. Coisas confusas, palavras ocas - gestos... Apenas sei que terminou, pedindo contra mim a mais grave das penas aplicáveis aos meus crimes.
Do meu defensor, é estranho, não me lembro. É inútil insistir. Ai de mim! no meu passado, alguma coisa há de ficar inexplicável.

(pgs. 9/10)

Nota: Não sei se este livro é de leitura obrigatória no Centro de Estudos Judiciários. Se o não é, deveria sê-lo; este e outros. É que à justiça falta literatura.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Leituras

Como poucos, Canetti refletiu profundamente sobre os desastres do nosso século, a ascensão do fascismo, o desenvolvimento hipertrófico dos aparelhos do poder, o assassinato de judeus, a amplitude do aniquilamento nuclear, e como poucos outros escritores chegou, ao longo da sua evolução, à noção de não poder contentar-se com representações do fim. O seu ideal não é o do profeta, mas o do professor que fica feliz quando percebe que, como se pode ler nas suas notas às palavras de Confúcio, a aprendizagem não tem fim. Enquanto o detentor do poder permanece sempre no mesmo lugar, aquele que aprende está sempre em viagem.

Pags. 107/108

Este trabalho com o título Summa Scientiae - Sistema e crítica do sistema em Elias Canetti foi publicado em 1983

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Obama, até ao fim

President Obama on Tuesday largely commuted the remaining prison sentence of Chelsea Manning, the army intelligence analyst convicted of an enormous 2010 leak that revealed American military and diplomatic activities across the world, disrupted the administration, and made WikiLeaks, the recipient of those disclosures, famous.

The New York Times

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Barack Obama

Obama publicou uma excelente e corajosa reflexão, na Harvard Law Review, sobre o papel do Presidente no avanço da reforma da justiça criminal nos EUA.
Permito-me chamar a atenção para a secção intitulada Reinvigorating Clemency, confrontando-a com a clemência presidencial portuguesa, parca e envergonhada.
Through considering grants of clemency to individuals in the federal system, the President gains a unique vantage point into the fairness of federal sentences. While not a substitute for the lasting change that can be achieved by passage of legislation, the clemency power represents an important and underutilized tool for advancing reform. The Framers gave the President this authority to remedy individual cases of injustice,128 and the Supreme Court has made clear that this power is entrusted to the President’s discretion, unimpeded by congressional limits.