segunda-feira, 30 de novembro de 2015

As cenas da justiça

A cena do microfone-espião no gabinete do Procurador-Geral da República é já muito antiga. Não me lembro de como terminou, a não ser que terminou sem ter sido levada muito a sério. As cenas da justiça, as de hoje, continuam a não ser levadas muito a sério. Um pacto de silêncio desmerece a ética e o profissionalismo. O que está em causa é o caldo de cultura de que aqui falei, há mais de cinco anos, ingloriamente.

Leituras

Quatro são, disse, as bases em que assenta a civilização europeia, quatro os princípios que constituem a sua individualidade ou essência. São eles a Cultura grega, a Ordem romana, a Moral cristã e a Política inglesa. Não temos que ver se esses princípios nos são agradáveis, a cada um de nós pessoalmente, ou se não nos são agradáveis. Temos que saber que são e o que são. Não temos que servir-nos da razão estulta - que, porque é estulta, não é razão - de que não somos cristãos, ou não somos ingleses; pela mesma razão repudiaríamos o que nos deram a Grécia Antiga e a antiga Roma, pois nenhum de nós hoje é grego da antiguidade ou romano da Roma extinta. É a civilização construída por uma série de criações, cada uma das quais, por uma razão de ambiente próprio e circunstâncias históricas propícias, particularmente compete a uma determinada nação. Pretender repudiar um princípio formador de civilização porque seja alheio à nossa índole, ou quer dizer que repudiamos a mesma ideia de civilização, que envolve transformação e portanto alterações de «índoles», ou que julgamos a nossa nação apta a produzir em si mesma a civilização inteira, conceito que pode surgir só no cérebro de um megalómano patriótico.

(pgs. 204/205)

sábado, 28 de novembro de 2015

A Ponte dos Espiões

O filme de Spielberg é uma lição sobre a ética que deve informar a justiça; mesmo quando um hipotético interesse nacional está em causa, não se pode/deve ceder nos princípios. A justiça não é uma aparência, uma encenação para consumo social. O está-se mesmo a ver que é culpado é um dos mais perigosos argumentos judiciários.

Segurança Interna e Política Criminal

O Programa do XXI Governo Constitucional conjuga, sob a mesma epígrafe, a Segurança Interna e a Política Criminal. É uma opção inovadora e que anuncia que se irá ultrapassar a estanquidade dos conceitos e das práticas. O reforço da capacidade de intervenção do Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna e a criação de um Centro de Comando e Controlo encontrará as naturais resistências que são consentidas por um número injustificado de operadores.

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Agilizar a Justiça

Do Programa do XXI Governo Constitucional, no que à Justiça diz respeito, destacam-se as medidas em que a arbitragem e outros meios alternativos assumem uma particular relevância:

O alargamento da competência e da rede dos julgados de paz, bem como dos centros de mediação e de arbitragem; 
A limitação da possibilidade de um litígio entre pessoas coletivas públicas ser dirimido através dos tribunais, impondo-se valor mínimo das causas, fomentando os pré-pagamentos e incentivando-se o recurso à mediação ou à arbitragem;
A adesão geral das entidades da Administração Estadual à jurisdição dos centros de arbitragem administrativa já existentes, assim se permitindo um julgamento mais rápido e barato de litígios que oponham cidadãos e empresas às entidades públicas, designadamente, em matéria de contratação pública, funcionalismo público e contencioso em matéria de utilização de fundos comunitários, sem prejuízo de exclusões motivadas por questões de segurança e de defesa; 
O investimento em incentivos à prevenção do conflito ou ao recurso a meios alternativos, em especial no âmbito das relações de vizinhança, relações familiares, heranças e em casos de sobreendividamento, através, designadamente, do estabelecimento de processos alternativos obrigatórios e do estabelecimento de regras que responsabilizem conjuntamente credor e devedor quando o incumprimento de um contrato for previsível por parte do credor;
A imposição de os litígios emergentes de contratos de fornecimento de serviços de televisão, telecomunicações e de Internet, bem como de fornecimento de eletricidade, água e gás, passarem a estar sujeitos a arbitragem obrigatória, não podendo os custos do uso da arbitragem para o consumidor ser superiores a 5% do valor do IAS por ação.

Leituras

A obra de Pessoa define metatextualmente a ficção de um Livro ideal nunca atingido (talvez inatingível), partindo de livros existentes. Os metatextos, ora descritivos, ora normativos, inventam um fantasma de obra ao qual comparam, com decepção e angústia, a escrita realizada. Este modelo de totalidade define-se como uma construção ou, de acordo com uma metáfora atribuída por Pessoa a Aristóteles, um animal ou organismo, uma organização de órgãos com funções e relações com o todo definidas.

(pag. 261)

Da nota de divulgação da Universidade do Porto:
No próximo dia 30 de novembro completam-se 80 anos da morte de Fernando Pessoa e a Universidade do Porto vai assinalar da data com uma conferência intitulada "Fernando Pessoa e a sua época". Integrada na jornada comemorativa do centenário da revista Orpheu, a conferência será proferida por Pedro Eiras, docente da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Como Fernando Pessoa participou, através de Álvaro de Campos na revista Orpheu. O papel de Fernando Pessoa na revista e o papel da revista na vida do autor da Ode Triunfal, este encontro entre o poeta e a revista vai ser o mote para a conferência. Apesar da sua curta existência, apenas dois números publicados nos primeiros trimestres de 1915, a revista Orpheu revolucionou o panorama social e cultural do país.
Recordamos que para celebrar o centenário da revista Orpheu, a Universidade do Porto tem patente a exposição "Orpheu e a sua época". Instalada na antiga Sala de Mineralogia, logo à entrada do edifício da reitoria, a exposição pode ser visitada até 15 de dezembro, de segunda a sexta-feira, das 10h00 às 18h00. A palestra de Pedro Eiras acontece às 18h00 de dia 30 de novembro na Biblioteca do Fundo Antigo, ao edifício da reitoria da U.Porto.
A entrada é livre.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Leituras

No total, entre o primeiro acto terrorista da rede MDLP, e grupos associados, em Maio de 75, e o último, em Abril de 77, houve 566 acções, assim discriminadas:
- 310 atentados bombistas
- 136 assaltos
- 58 incêndios
- 36 espancamentos
- 16 atentados a tiro
- 10 apedrejamentos
Cerca de metade destas acções criminosas ocorreram nos primeiros seis meses, mas prosseguiram para além do 25 de Novembro e da promulgação da Constituição. Iriam diminuindo de intensidade, depois da entrada em funções do 1º Governo Constitucional, em Julho de 1976, para o que contribuiu a prisão pela Polícia Judiciária de alguns dos operacionais.

(pag. 74)

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Os prazos (2)

Os prazos de prisão preventiva protegem os cidadãos dos caprichos: sem eles, os prazos, esses caprichos, mais do que uma tentação, seriam uma certeza.
Um processo equitativo, leal e convincente não se coaduna com prazos de prisão preventiva que não se afigurem razoáveis, nomeadamente quando, decorridos, os arguidos podem continuar a não conhecer a sua culpa.
O aumento dos prazos de prisão preventiva tem resultado mais de pressões corporativas do que de exigências funcionais objetivas.
Estou em crer que esse aumento foi um dos contribuintes para a banalização da prisão preventiva, com o seu eco comunicacional de condenação prévia.

domingo, 22 de novembro de 2015

Os prazos (1)

O Código de Processo Penal de 1929 estabelecia no seu artigo 308º, e sob a epígrafe Prazos de prisão preventiva sem culpa formada, o seguinte:
Nenhum arguido pode estar preso sem culpa formada além dos prazos marcados pela lei
§ 1º Desde a captura até à notificação ao arguido da acusação ou do pedido de instrução contraditória pelo Ministério Público, esses prazos não podem exceder:
1º Vinte dias, por crimes dolosos a que caiba pena correcional de prisão superior a um ano;
2º Quarenta dias, por crimes a que caiba pena de prisão maior;
3º Noventa dias, por crimes cuja instrução preparatória seja da competência exclusiva da Polícia Judiciária ou a ela deferida.
§ 2º Desde a notificação ao arguido da acusação ou do pedido de instrução contraditória pelo Ministério Público até ao despacho de pronúncia em 1ª instância, os prazos de prisão preventiva não podem exceder:
1º Três meses, se à infração couber pena a que corresponde processo correcional:
2º Quatro meses, se ao crime couber pena a que corresponde processo de querela.
A redação do preceito com este teor resultou do Decreto-Lei nº 185/72, de 31 de maio, traduzindo-se num aumento substancial dos prazos de prisão preventiva sem culpa formada até então em vigor.

sábado, 21 de novembro de 2015

Uma justa indemnização

The government of Washington, D.C., has agreed to pay $16.65 million to a man after a federal jury found that two police detectives had framed him for the 1981 rape and murder of a college student, a crime for which he was wrongly imprisoned for 27 years.

The amount was the largest in a civil rights verdict in the history of the District of Columbia, said a lawyer for the man, Donald E. Gates, and raised the possibility that the retired detectives, Ronald S. Taylor and Norman Brooks, might have committed similar misconduct in hundreds of homicide cases going back three decades.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

A pseudociência forense

But questions of forensic science’s reliability go well beyond hair analysis, and the FBI’s blunders aren’t the only reason to wonder how often fantasy passes for science in courtrooms. Recent years have seen a wave of scandal, particularly in drug testing laboratories. In 2013 a Massachusetts drug lab technician pled guilty to falsifying tests affecting up to 40,000 convictions. Before that, at least nine other states had produced lab scandals. The crime lab in Detroit was so riddled with malpractice that in 2008 the city shut it down. During a 2014 trial in Delaware, a state trooper on the witness stand opened an evidence envelope from the drug lab supposedly containing sixty-four blue OxyContin pills, only to find thirteen pink blood-pressure pills. That embarrassing mishap led to a full investigation of the lab, which found evidence completely unsecured and subject to frequent tampering.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Húmus

Dou comigo a reler o Húmus, de Raul Brandão. A vila de ontem parece-me a cidade de hoje; só que com mais encurralados na mesma paciência pegajosa. A resignação continua um valor e a inveja um argumento. Ligo a televisão e o que descubro é que a realidade é a manha, a astúcia que cada um põe em jogo. São as sombras que teimam em comandar a vida, com um inferno anunciado em cada dia.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Responsáveis pelo erro judicial


Da entrevista com Reuven Fenton:

IP: You interviewed exonerees from all over the country. What would you say was the biggest contributing factor in their wrongful convictions?
RF: Misconduct by police or prosecutors had a role in the convictions of 47 percent of the 1,700 people listed on the National Registry of Exonerations, as well as nearly all the exonerees profiled in this book.
One of the exonerees I profiled, Devon Ayers, was wrongfully convicted as a teenager of murdering a Federal Express employee and a livery cab driver in the Bronx. He was a classic victim of unfair and overly aggressive law enforcement practices. Ayers might not have done 18 years in prison had police turned over a crucial surveillance video that discredited one of the key witnesses. While researching his case, Ayers’s legal team discovered that police had also fed crime scene details to two drug-addicted witnesses to help them “recollect” what they’d seen.

Tempos outros

Em 9 de novembro, em Washington, delegações dos EUA e de Cuba reuniram-se visando a cooperação nas áreas do terrorismo, do narcotráfico, do crime transnacional, do cibercrime e da segurança nos transportes e no comércio.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Brandos costumes

Dezenas de milhares de cidadãos manifestaram-se, em Madrid, no passado sábado, contra o terrorismo machista.
Pelo menos no noticiário da RTP, na discreta notícia que passou sobre o acontecimento, falou-se de uma manifestação contra a violência doméstica, sem que antes se referisse, diria que ironicamente, o número de queixas que neste âmbito são apresentadas por homens.
A expressão violência doméstica alivia as consciências e pretende fazer crer que, em matéria de violência, há uma paridade de género.
A indiferença social perante a violência exercida sobre as mulheres tem de combater-se com outras palavras: palavras tão violentas quanto a violência que sobre elas é exercida.

sábado, 7 de novembro de 2015

Tempos outros

Our sense of and respect for authority has changed dramatically over the last ten or so years. This shows in the courtroom, where the judge is no longer seen as the natural authority. These modifications in the social life should also be visible in a criminal procedure. 

German Law Journal, em edição sobre Plea Bargains in Germany